
Estaríamos nós, Homo Sapiens, irrevogavelmente à deriva sem as meticulosas instruções delineadas por arquitectos cósmicos? Será que sem um guia ou plano superior, estaríamos destinados ao caos moral e ético?
Navegando pelas tumultuosas águas do Tempo, encontramos o Homo Sapiens nos seus primórdios, dando os primeiros passos na intrincada dança da existência. Durante aqueles anos, não eram precisamente as luzes da ribalta que nos aguardavam, mas sim uma realidade dura, e crua. Morríamos por simples cortes que se infectavam, dentes que se tornavam abcessos mortais, ou ao sabor das intempéries que nos açoitavam dia após dia sem piedade. Ah, e não esqueçamos aqueles adoráveis predadores que nos viam como um bom aperitivo.
E eis que, depois de milénios neste incessante bailado de sobrevivência, surge uma inesperada reviravolta. O divino, após observar pacientemente esta dança da humanidade — às vezes trágica, por vezes cómica —, decidiu finalmente que era hora de intervir. E qual o palco escolhido para tão majestosa revelação? Uma tribo peculiar no Médio Oriente, claro, provavelmente no único sítio daquela zona sem petróleo. Analfabetos, tribalistas, agressivos, e perseguidos; que grande ideia, oh Divino, revelares-te a eles, e não aos Chineses, que já sabiam ler e fazer matemática.
Foi aí, num gesto magnânimo de poder absoluto, que foi revelado à humanidade que, pasme-se, assassinar ou enganar o próximo não eram, afinal, kosher. E, de repente, como que por magia, tudo fez sentido. Ah, o iluminado trajecto da moralidade!
A sugestão de que vagueávamos como bárbaros amnésicos, até este pitoresco momento de revelação, é de uma comédia tão refinada que quase parece trágica. Teríamos nós sobrevivido e prosperado sem a capacidade inata de cooperação, sem aquela centelha de empatia, sem aquele pingo de altruísmo?
Ah, e a regra de ouro! Aquele mantra universal que prega; “Não faças aos outros o que detestarias que te fizessem a ti“. Este lema moral, que apareceu em escritos tão antigos como os de Confúcio ou até no antigo Zoroastrismo, aparentemente não necessitou de intervenção divina para ser gravado nas almas humanas. Talvez, e só talvez, esta ética seja fruto de um consenso humano, resultado de milénios de experiência e evolução.
É quase tocante ver a indignação que se acende nos olhos dos devotos quando a lógica e a ciência entram em cena, desafiando os seus sagrados preceitos. E, com todo o respeito, é uma maravilha ver como se surpreendem ao descobrir que, mesmo sem o olhar vigilante de um ser supremo, muitos de nós escolhem ser bons por convicção e não por imposição.
E, aqui entre nós, não é fascinante pensar que mesmo sem uma bússola divina, muitos de nós optam por praticar o bem na sombra do anonimato? Sim, actos de bondade que acontecem longe das luzes, dos aplausos, e das promessas celestiais. Parece que a decência não necessita, afinal, de plateia nem de recompensas divinas. E essa é a essência pura e inabalável da humanidade.